“Os responsáveis por colocar nosso time na série B, especialmente a Diretoria Executiva, que é quem faz a gestão do futebol, devem sim ser julgados democraticamente por suas ações”
Foto: Montagem / Info Bahêa
*Por Leonardo Martinez
Existem expressões e defesas nos discursos gerais que são unanimidades e servem de muleta para construção de uma versão convincente que muitas vezes camufla uma subversão da realidade de atos, perigosos atos.
Quem não é favorável ao combate da fome mundial? Quem não apoia a luta em favor da paz no mundo? Quando você ouve alguém dizendo que luta por esses ideais, imediatamente você cria uma simpatia por aquele discurso, é algo fisiológico!
Quando, atualmente, você ouve alguém gritando: “A torcida não quer mais ver o Bahia perder”, “estamos cansados de tanta incompetência”, “chega, basta, quero meu Bahia campeão novamente!”.
Fisiologicamente e intuitivamente seu cérebro é programado para simpatizar com esse discurso, afinal, nós, torcedores natos e apaixonados, o que mais queremos é isso e logo você se identifica.
O problema está na distância do discurso de quem “luta em favor da paz mundial” e as verdadeiras atitudes e ações concretas que favoreçam para atingir esse cenário.
No Bahia, temos um passado recentíssimo em que não conseguíamos exercer um direito básico de uma associação desportiva, o simples direito de ser sócio e acompanhar a vida do clube.
Quem não se lembra das longas filas formadas no edifício Capemi quando finalmente conseguimos, através da intervenção judicial, exercer esse direito? Os mais lúcidos e bons de memória lembrarão que não sabíamos para quem devíamos, quanto devíamos e o teor dessas dívidas! Fomos surpreendidos inúmeras vezes no período pós-democrático com apresentações por credores de confissões de dívidas e contratos que nem sequer constavam nos registros do clube. Quantos jogadores perdemos e saíram de graça por evidentes e anunciados atrasos no recolhimento do FGTS? Quantas vezes fomos humilhados por jogadores que diziam que não viriam para o Bahia por ser um time que não honrava com o pagamento de salários e outras obrigações?
Não sabíamos quem seriam nossos presidentes e nem quem eram ou seriam os conselheiros, no máximo conseguíamos prever o sobrenome dos próximos empossados, que muitas vezes se repetiam incessantemente e alternadamente.
Mas aí tem quem diga, novamente vendendo aquele discurso amigável ao seu cérebro, que o “importante é ser campeão” ou “somos um time de futebol, o importante é bola na rede!”
O problema desse discurso é a realidade. Os interlocutores dessa defesa, seletivamente, esqueceram que na década de 2000 e até o período anterior à democratização do clube, época em que posteriormente descobrimos que o Bahia que estava atolado em dívidas, pagava as contas de restaurantes e hotéis regadas a whisky, vinhos e espumantes para “acompanhantes”, mesma época da confusão das contas pessoais dos gestores com as do clube e das obscuridades que levaram à falência administrativa e financeira do Bahia, foi também a mesma época que amargamos a pior década esportiva do nosso time.
Foi nessa época que enfiaram o Bahia na série C, foi nessa época que passamos quase dez anos sem ganhar um mísero título estadual, tempo que durante a temporada chegamos a ficar 40 dias sem disputar nenhuma partida por termos sido eliminados de todos os campeonatos e fomos humilhados desportivamente por algumas vezes.
Óbvio que é verdade que um time de futebol vive de resultados esportivos, mas é mais verdade ainda que não precisamos voltar ao caos democrático e de desmandos para ter resultados positivos! Não nos deixemos enganar que a solução esteja no caos e na perda de direitos democráticos arduamente conquistados. Quem lutou e conhece a história da Democracia Tricolor, sabe como foi árdua essa luta e importante para um crescimento robusto e coeso.
Ainda consigo me impressionar com a desfaçatez de pessoas que participaram dos maiores desmandos e das maiores humilhações sofridas no Bahia, seja no ponto administrativo, seja do ponto de vista futebolístico, tenham coragem de, em tom professoral, escrever cartas ou participar de programas esportivos apontando erros e dizendo o que deve ser feito. É muita falta de noção e uma aposta alta na falta de memória do torcedor!
Temos o exemplo claro, evidente, de um time de futebol local que quis brincar de fazer democracia e depois não a sustentou. Esse time que não completou um só mandato de um só presidente dos seus últimos, sob a pressão da flexibilização da soberania popular e resolveu voltar a forma antiga, ultrapassada e inoperante de retroceder a um gestor que prometia resultados de qualquer jeito ou qualquer forma.
Hoje esse time está no lugar e na situação mais temida por todos nós e com sérios riscos de sucumbir definitivamente, pois além da dificuldade administrativa e financeira, sofre sanções por desmandos dos dinossauros da gestão esportiva.
Vão novamente tentar induzir seu cérebro para o discurso fácil do “passa pano”, “defensor”, “peru”, “amém” .
Essa é a forma mais fácil de despertar sua ira e raiva, pois faz uma rápida conexão com suas insatisfações, com os últimos resultados, com aqueles que são responsáveis por colocar nosso time na série B, especialmente a Diretoria Executiva, que é quem faz a gestão do futebol e seus membros que devem sim ser julgados democraticamente por suas ações.
Meu apelo é que você saia desse modo automático, beligerante, que normalmente cega as razões. Te convido ao pensamento racional, para o lógico. Não se trata de defender esse ou aquele, trata-se de defender a DEMOCRACIA , trata-se de defender o seu direito de tirar ou colocar esse ou aquele do poder.
A soberania popular, a democracia, as regras do jogo previstas no Estatuto, que também foram conquistadas democraticamente devem ser defendidas arduamente e de forma inegociável, por todos, inclusive os contrários e mais fiéis opositores de um projeto político, pois são através dessas regras que teremos o direito indiscutível de propor as mudanças ou manter os acertos.
Devemos também ter atenção aos arautos da razão e àqueles que querem se apropriar de forma hierárquica em relação as conquistas democráticas do Clube. Não existe hierarquia na democracia, existe a coletividade, existem os que lutaram de forma mais visível e existem os que fizeram significativa diferença em meio ao silêncio das suas ações.
Não coloco em dúvida o amor e a dedicação do torcedor que defende o ponto de vista diferente do meu, pois nesse meio, a grande maioria faz essa defesa de forma apaixonada e por muitas vezes a paixão nos cega. O ponto de atenção é para aqueles que querem na força, na tora, na marra, de forma consciente ultrajar a soberania democrática para atingir seus objetivos pessoais.
Fiquem atentos e vigilantes Nação Tricolor, pois a Democracia é algo difícil de ser conquistada, mas a tentação de ruí-la, por uma parte pequena de gestores ultrapassados, inclusive utilizando e induzindo verdadeiros torcedores apaixonados do Bahia, deve ser rechaçada com força e altivez sob pena de termos que amargar retrocessos e revisitar as mais profundas e tenebrosas épocas do nosso Esporte Clube Bahia.
*Leonardo Martinez é Torcedor do Bahia, Gestor, Advogado e Presidente do Conselho Deliberativo do Esporte Clube Bahia.
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